O minimalismo, inicialmente um movimento artístico e arquitetônico dos anos 1960, que propunha a valorização da forma pura, da funcionalidade e da simplicidade, vem se transformando em um estilo de vida promovido por influenciadores, empresas de tecnologia e até governos. O discurso é sedutor: “menos é mais”, “desapegue”, “liberte-se do consumo”. No entanto, por trás dessa estética limpa e disciplinada, esconde-se um perigoso mecanismo de controle simbólico e político.
Num tempo em que a precarização do trabalho, o custo de vida elevado e a instabilidade social se tornam regra, o minimalismo surge como uma solução moralista para problemas estruturais. Em vez de questionar por que as pessoas não conseguem mais acessar bens básicos ou realizar seus desejos materiais, o discurso minimalista as convida a “querer menos”, “viver com pouco”, “agradecer pelo essencial”. A pobreza é estetizada, enquanto a revolta é suavizada por mantras de autossuficiência e controle emocional.
Por trás do apelo à simplicidade, existe uma arquitetura de conformismo. Viver com menos deixa de ser uma escolha para se tornar uma virtude forçada. O sujeito minimalista ideal é organizado, limpo, silencioso, produtivo — um cidadão-modelo que consome menos, questiona pouco e se adapta facilmente a espaços padronizados, como apartamentos minúsculos e coworkings genéricos. É o tipo de corpo e mente que o neoliberalismo adora: leve, flexível, portátil e adaptável às flutuações do mercado.
O minimalismo também serve a um ideal político de neutralização. Ao promover a estética do “vazio” e do “branco”, ele apaga marcas culturais, sociais e históricas. É uma forma de apagar os excessos, os conflitos, a desordem — ou seja, tudo aquilo que é vivo, popular, marginal, subversivo. Não é coincidência que muitas sedes de grandes empresas e governos adotem esse estilo: quanto mais asséptico o ambiente, menos espaço para dissenso ou desobediência. Trata-se de uma engenharia visual do poder.
Em vez de um caminho para a liberdade interior, o minimalismo muitas vezes atua como um verniz moral para a lógica da escassez imposta. É preciso perguntar: estamos escolhendo viver com menos ou estamos sendo condicionados a aceitar menos? Reduzir o desejo a uma questão de autogestão emocional é conveniente para um sistema que já não oferece alternativas concretas. A estética da renúncia esconde a política do abandono.
Portanto, é necessário um olhar crítico. Minimalismo pode ser libertador, sim — mas só se for uma escolha consciente, e não uma adaptação estética a um sistema desigual. Caso contrário, ele se transforma num espelho polido do controle: bonito, limpo, e absolutamente vazio de resistência.